Search

segunda-feira, 23 de abril de 2007

O Japão e o Século XIX (II)

Paramos na unificação. Bem, na verdade nas minhas considerações babacas que incluíram até o Slam Dunk, que não tem nada a ver com história ou século XIX...xD
Devemos continuar no que veio depois. Puxa, lendo agora, essa frase ficou tão óbvia...^^'
Err... Ok, vamos lá!o/



Período Edo.
Ano... Sumimasen...

A Era Edo ou Tokugawa (1603 - 1868)

Em 1603, Tokugawa Ieyasu estabelece o início do xogunato de seu clã, que irá durar mais de 2 séculos. Uma dita "era de paz", pois não há aqueles conflitos civis generalizados entre os clãs que assolavam o Japão anteriormente. Mas qual era o porquê dessa ausência de conflitos? Repressão imediata e violenta, claro.:D
Tokugawa Ieyasu era agora o "Generalíssimo" (Shogun) da nação. O nome do período em que seu clã governou ficou conhecido por "Era Edo" porque o governo foi estabelecido... em Edo - atual Tokyo!:D
O regime adotado era o feudalismo, em que haviam sido estabelecidas rígidas regras entre os daimyôs (suseranos), samurais (vassalos) e os lavradores (servos).
Nessa época, todos os estudos e publicações que pudessem contestar o poder do Shogun foram proibidos. Depois de alguns anos, até mesmo os portos japoneses foram fechados ao mundo para que fosse evitada a incursão de pensamentos subversivos vindos do exterior. Os únicos estrangeiros permitidos de comercializar com a Terra do Sol Nascente eram os holandeses, que ainda assim ficavam restritos ao porto de uma pequena ilha, Dejima. O Cristianismo, que andava colocando as asinhas de fora no país, foi proibido; muitos de seus seguidores foram mortos ou convertidos ao Budismo e Shintoismo a força...

A fim de evitar rebeliões e conspirações, os senhores feudais (daimyôs) foram escolhidos a dedo pelo primeiro Shogun dessa época. Não apenas isso, a enorme precaução de Ieyasu consistiu em fazer cada um dos governantes locais se apresentarem no castelo de Edo para executarem serviços governamentais e fazerem investimentos em obras públicas, no período de um ano (ano sim, ano não... o.O); como os investimentos em si, a viagem, a estadia e as roupas cerimoniais para tal ocasião custavam caro, essa ação tinha por objetivo fazer os daimyôs se ocuparem financeiramente, de modo a nunca conseguirem aplicar dinheiro em exércitos paralelos ao do "Generalíssimo". Mas como precaução e caldo de galinha nunca fazem mal a ninguém (só à galinha - e a pessoas alérgicas a ela), o Shogun ordenou que alguns membros das famílias dos governantes regionais vivessem ali na capital; com isso, ele tinha reféns para usar, caso algum dos daimyôs se revoltassem. Espertinho esse Ieyasu, nee?o.O

Os samurais eram uma classe abaixo dos daimyôs, sendo vassalos que usavam sua espada a favor de seus suseranos. Se você já viu filmes, documentários, livros ou qualquer coisa assim, pode lembrar que a própria palavra "samurai" significa justamente "aquele que serve". Tais guerreiros sobreviviam de suas relações com os senhores feudais; geralmente eram pagos com arroz e privilégios por seus serviços, mas não podiam possuir terras. Esse tipo de situação obrigava os samurais a escolher entre abandonar a espada e tornarem-se simples aldeões, ou a servir algum senhor de terras.
Em geral, esses guerreiros eram relativamente cultos (sabiam algo de caligrafia e artes, e muito de manejar a espada) e viviam sob a filosofia do Bushido, literalmente, "o caminho daquele que serve", uma vez que "bushi" é um quase-sinônimo de "samurai". Esse código de ética não-escrito, tratava a morte como uma maneira de perpetuar a vida... Mas como dizia o Cap. Queiroz, nosso professor de Filosofia: "Tá, mas que bicho é esse"?:)
Pela máxima do bushido, "a vida é limitada, mas o nome e a honra do samurai são perpétuos". Portanto, morrer era uma honra, especialmente se fosse em conflito. Esse era o tipo de pensamento que fazia esses guerreiros tão eficientes em campo de batalha; afinal, se você tão tem nada a perder morrendo, por que se poupar nas lutas?:)
Vocês também já devem ter ouvido falar no harakiri (hara = barriga, kiri = cortar), no qual o samurai derrotado utilizava um tantô (adaga) para cortar a barriga, ajoelhado, enquanto, algumas vezes, o inimigo cortava a sua cabeça com uma katana (espada longa). Na realidade, harakiri é uma palavra que demonstra mais a visão ocidental do que a oriental sobre tal ato. A palavra para todo o ritual que se passava é seppuku, e ele acontecia quando o guerreiro era derrotado em campo de batalha (aí, em geral, era seguido da decapitação), ou quando falhava em servir ao seu suserano (nesse caso, a morte era lenta e dolorosa, pois o bushi devia demonstrar seu tremendo autocontrole em relação à dor, não só enfiando a espada na barriga, como puxando-a para cima o máximo que conseguisse).
Quando um homem se tornava samurai, toda a sua família deveria servir ao daimyô e se submeter às regras deles. Se o guerreiro falhasse com o seu senhor, a família inteira deveria acompanhá-lo no ritual do seppuku, para que a honra fosse lavada... Samurais desgarrados, que abandonavam seus daimyôs, eram considerados párias, sendo aí chamados rounins.
As pessoas dessa classe não eram habitantes do campo, mas citadinos, embora vivessem às custas de uma classe social bastante reprimida por eles próprios: os lavradores.

Os camponeses, lavradores e aldeões eram a base da hierarquia social. Como nem os samurais (que nada produziam), nem os daimyôs, funcionários do governo, pagavam impostos, já se pode supor quem arcava com os gastos de tudo... Sim, como é de praxe, muda-se o país, a cultura, a língua e o lado do mundo... mas a classe baixa é sempre a mesma explorada e prejudicada...¬___¬
Bem, se você ainda está lendo e absorvendo esse blog, deve lembrar que lá nas batalhas de unificação, um cara chamado Toyotomi Hideyoshi desarmou a população. Isso já foi uma mão na roda para o governo Tokugawa, que estabeleceu regras ainda mais rígidas sobre a população. Os lavradores eram obrigados a pagar os impostos com 50% da produção (sendo assim obrigados a diminuir o próprio consumo de arroz)! Além disso, se o governo requisitasse algum serviço gratuito dos lavradores, eles deveriam fazê-lo...:P
Não à toa, o final da Era Tokugawa ocorreu por, entre outras coisas, revoltas camponesas...
Por fim, os últimos integrantes da hierarquia japonesa eram os comerciantes. Na teoria. Na prática, financeiramente, os mercadores estavam em ascensão constante como classe - até mesmo mais do que os próprios samurais, colocados no topo mas, muitas vezes, miseráveis.

Castelo de Osaka, na primavera.
Castelo de Osaka, onde os inimigos de Tokugawa foram eliminados no início do regime.
O Fim da Era

Como já deu pra perceber, a "paz" existente nesse período era algo forçado. Existiram, sim (e em grande quantidade), rebeliões provocadas pelo povo.
Primeiro por decorrência da situação entre as classes. Os samurais, por nada produzirem, dependiam exclusivamente dos daimyôs para tudo. Não cresciam financeiramente porque eram vassalos, mas dependiam eternamente do trabalho executado pelos lavradores de terra, possuindo domínio (ou seja, podendo cobrar impostos) sobre eles. A classe dos mercadores, que deveriam permanecer lááá embaixo na pirâmide hierárquica, estava se desenvolvendo e superando os samurais em termos de recursos financeiros, pois o governo se utilizava de uma política favorável à alta produtividade e ao uso da moeda corrente na época - algo que, diga-se de passagem, contrariava todo o sistema feudal.
Os samurais então, para conseguirem manter o seus luxos e se igualarem à burguesia, cobravam tributos e mais tributos dos camponeses, cada vez mais miseráveis. Logo, ocorreram grandes ondas de fome no país, que resultaram em saques e situações de caos. Foram efetuadas várias reformas durante essa Era, mas nenhuma delas resolveu efetivamente a questão social. A decadência dos samurais foi inevitável; a situação de relativa paz (ou seja, não-existência de guerras civis) havia tornado muitos desempregados e desocupados. Alguns para sobreviverem se dedicaram ao artesanato, outros viraram meros guarda-costas de daimyôs, houve os que se tornassem bandidos, e ainda alguns venderam a própria espada (considerada a alma do bushi) para conseguirem dinheiro.
Fora a situação social, que já havia chegado num limite, o outro problema do governo dos Tokugawa veio do exterior: Estados Unidos, França e Inglaterra estavam desenvolvendo a indústria. Os três concorriam entre si. Estavam sedentos por arranjar mercado consumidor - e por que não tentar naquele arquipélago que se encontrava, até então, isolado do mundo? Pois é. O Japão estava, literalmente, entre a cruz e a espada...o.o
Os movimentos pela restauração imperialista, nacionalistas e xenófobos estavam divididos entre se ocupar da reforma que modificaria o sistema de governo japonês e tocar os estrangeiros (já beneficiados com a abertura meio forçada dos portos, em 1851, por Matthew Perry, comodoro norte-americano) pra longe dos portos japoneses... O que fazer primeiro? A idéia original era primeiro dar um trato nos gaijins, depois se ocupar da reforma. Contudo, ao se darem conta do poderio estrangeiro, os japoneses optaram por fazer a restauração imperial primeiro.
Para isso, ocorreu a união entre senhores feudais de diferentes partes do país, que, marchando contra o shogunato (bakufu) de Tokugawa, angariaram tantos aliados para suas tropas revolucionárias, que Tokugawa Yoshinobu, o último Shogun, e seu exército, teve que reconhecer, em 1867, a derrota e entregar o poder ao Imperador Meiji.

Daishô, as armas dos samurais.
Tantô (adaga), wakizashi (espada curta) e katana (espada longa).
Ufa!
Agora, minhas considerações!\o/
1) Sobre o fechamento dos portos, no início do período: pense nos nossos antigos e queridos colonizadores, os portugueses. Bem, ao chegar no Japão, eles muito provavelmente enxergaram os japoneses quase como os nossos índios daqui, uns bobos úteis: "vamos difundir a fé cristã e colonizá-los, oba"! Entretanto o povo nipônico, diferentemente do indígena, não era ingênuo, primitivo e totalmente desunido. Ainda assim, os europeus encontraram a brecha que precisavam para converter mais de um pessoa à sua religião; muito espertinhos, eles perceberam que se incutissem as idéias católicas na cabeça do daimyô e o convertessem, o povo, os samurais, os lavradores, seguiriam-no. E foi isso que aconteceu. Sim, a religião cristã vingou entre muitos japoneses e se tornou um problema para o governo, que descobriu o que os portugueses e espanhóis andavam fazendo com as Américas, e, conseqüentemente, qual era o plano para o Japão - a Igreja já até arrecadava impostos nos lugares dos convertidos... P*to da cara (com o perdão da expressão), o Shogun tocou pra fora ou mandou matar muitos dos estrangeiros mal-intencionados e dos fiéis, aproveitando pra fechar os portos e deixar claro que o país não era a casa da mãe Joana. Mas os camponeses, que também já tinham assimilado a história de Jesus, da Virgem Maria e de todo o lero-lero católico (além de estarem saturados dos impostos a pagar), revoltaram-se. A perseguição aos cristãos só serviu para tornar o povo ainda mais fanático, o que resultou na Revolta de Shimabara (lugar que concentrava os católicos), em 1637. Como após a revolta ainda persistiam alguns cristãos, o governo continuou com sua perseguição, chegando a reconverter muitos, sob tortura, ao shintoismo ou budismo. Os católicos remanescentes praticavam a adoração escondida.:O
2) Apesar do início do governo ter se estabelecido em Edo, em meio a esses séculos, a capital passou para Kyoto; não me perguntem a data, mas tive que deduzir isso porque, apesar de não encontrar as datas exatas, notei que a capital passa para Edo (Tokyo), mais uma vez, quando acaba o shogunato Tokugawa... Vai entender...u.ù
3) A hierarquia (sempre ela...) em resumo (e teoria), do maior ao menor: Shogun, daimyôs, samurais, camponeses/aldeões e mercadores. A família Imperial sempre existiu, mas, nesse período, não era nada além de uma figura decorativa. O que foi crescendo nos japoneses, o sentimento nacionalista, é o que trouxe à tona o desejo de serem governados por um Imperador, alguém de linhagem divina, e não um ditador militar.
4) Os samurais, figuras conhecidas pelo mundo inteiro como símbolo da disciplina e honra japonesas, como você pode constatar, nem todos foram essa maravilha. Sim, pelos que seguiam o código de honra do Bushido, havia o respeito da população; mas também existiam aqueles corruptos que praticavam o abuso de poder e ganhavam o ódio dos lavradores. Ironicamente, o samurai mais admirado, até hoje, pelo povo nipônico, não serviu a um daimyô; era um pária, um desgarrado, um rounin. Falei dele no post passado: Miyamoto Musashi.
4) Como admiradora amadora (?) de arte, não poderia deixar de falar num estilo de pintura e gravura que se desenvolveu nesse período: o Ukiyo-e. Ukiyo, o mundo flutuante é uma idéia do zen-budismo; o conceito de que você e seu mundo são insignificantes dentro do Universo inteiro, de que cada pequeno momento é efêmero e a cada instante, tudo muda. Enfim, o "mundo flutuante" é nada mais, nada menos que... o mundo de agora! Em Ukiyo-e, o ideograma "e" significa "retrato", "desenho", "ilustração". Então "retratos do mundo flutuante" eram gravuras que mostravam determinado momento ou situação cotidiana das cidades; não mostravam fatos históricos, mas atividades de entretenimento, da multidão e de paisagens naturais, coisas que, um segundo após terem começado a ser retratadas, já haviam mudado. Uma ótima representação da idéia desse movimento foi a obra de Hokusai (um dos principais artistas da época) entitulada de "36 Vistas do Monte Fuji" (Fugaku Sanjuu-Rokkei), em que o autor retratou a paisagem de diferentes ângulos, em diferentes épocas do ano.

Exemplo de Ukiyo-e.
"Por Trás da Grande Onda, em Kanagawa", de Hokusai.
Crianças, no próximo post vou chegar finalmente no ponto de interesse: a Era Meiji, no século XIX, nessa mesma hora, nesse mesmo canal.
Jaa!o/

4 comentários:

Maru disse...

Destaque para a quantidade de expressões populares usadas por mim nesse post...:O

xD

[Detalhe que a ânsia por comentários me fez comentar no próprio texto...xD]

Silvana Schuler Pineda disse...

Eu sei como é... Deve ser uma ansiedade semelhante que me faz ficar falando sozinha de vez em quando. ehehehehe
Beijo

Pandora disse...

Amei seu blog e olha que achei sem querer... cara muito kawaii!!! Informativo, esse poste sobre o Japão me lembrou um livro que estou lendo, Xogun, acho que vc já leu tb... muito bom, James Clavel é brilhante falando sobre o Japão feudal, se vc não leu ainda vale a pena ler!!!

Parabéns!!!

Pandora disse...
Este comentário foi removido pelo autor.